Teoria Geral do
A Jurisdição é a função estatal que tem como escopo a solução de conflitos aplicando ao caso concreto a solução determinada pelo ordenamento jurídico. Mas como já foi visto, a jurisdição é inerte. O Estado somente pode fazer atuar a vontade concreta da lei através da provocação do interessado. Esta provocação é feita através de uma ação.
A tutela jurisdicional é prestada através do exercício do direito de ação. Com efeito, ação é o direito ao exercício da atividade jurisdicional. Desta forma, através do exercício do direito de ação o Estado é provocado para prestar a jurisdição através de um processo.
O conceito de ação como um direito autônomo foi construído através do embate de diversas teorias sobre a natureza jurídica da mesma.
b) Teorias sobre a natureza jurídica da ação
A natureza jurídica da ação veio se transformando ao longo dos anos na mesma proporção em que o processo se desenvolveu enquanto ciência e instrumento de efetivação do direito material.
A primeira teoria, denominada de imanentista, sustentava que a ação estava diretamente ao direito material, não existia a autonomia do direito de ação. Direito material e a sua correspondente ação eram considerados faces da mesma moeda. O art. 75 do Código Civil de 1916 dizia que a todo direito corresponde uma ação, que o assegura. Tal dispositivo ilustra a lógica da teoria imanentista.
Com o avanço do tempo, percebeu-se que a teoria imanentista da ação não havia como prosperar, diante da complexidade das relações jurídicas e da construção de uma visão publicista do processo, onde se constatou que o direito de ação é diferente do próprio direito material, surgiu então a teoria da ação como um direito autônomo.
Assim, a teoria da ação como direito autônomo ganhou força dando ensejo a duas importantes teorias. A teoria da ação como um direito autônomo e concreto e ação como um direito autônomo e abstrato.
A teoria do direito autônomo e concreto baseia-se na idéia de que somente poderá ser exercido o direito autônomo de ação se houver um direito material concreto a ser efetivado. Vale trazer a lição de Cintra, Grinover e Dinamarco sobre o tema:
“Entretanto, como a existência de tutela jurisdicional só pode ser satisfeita através da proteção concreta, o direito de ação só existiria quando a sentença fosse favorável. Consequentemente, a ação seria um direito público e concreto (ou seja, um direito existente nos casos concretos em que existisse direito subjetivo.)”
A teoria da ação como direito autônomo e concreto, que tinha como defensores Chiovenda e Wach, foi sendo superada pela teoria da ação como um direito autônomo e abstrato, pois não explicava, com clareza as hipóteses em que a sentença julgava improcedente o pedido do autor. Neste sentido, ganhou força e veio se consolidando ao longo dos anos a teoria da ação como direito autônomo e abstrato exercido pelo autor contra o Estado, vez que este tem a função de prestar a tutela jurisdicional, e em face do réu que será submetido à decisão judicial.
A teoria da ação como direito autônomo e abstrato representa a ideia de que o direito de ação não está subordinado ao direito material. Ele é autônomo e pode ser exercido mesmo se o autor não tiver razão, eis a razão de sua abstração.
Com efeito, mesmo se a parte autora não tiver razão ela pode exercer o seu direito de ação e atuar junto ao Poder Judiciário para provar as suas alegações, mesma que estas não sejam acolhidas pelo Juiz. Esta atuação é garantida através do exercício do direito de ação, autônomo e abstrato.
Importante ressaltar, também, que o direito de ter um processo e o de provar suas alegações em juízo, consectário do direito de ação, pode ser exercido também pelo réu, quando se utiliza do processo para realizar a sua defesa. Aluisio Mendes apresenta está idéia da seguinte forma:
“O Estado Democrático de Direito passou a ter uma preocupação muito grande com o chamado processo e com os procedimentos, sob o prisma inclusive da própria legitimação política. É como se dizer que em uma eleição não basta escolher um bom candidato, há que se ter lisura no processo de escolha do candidato. Em termos de direito processual, pode-se dizer que não adianta uma pessoa ter razão e ter o direito material, há que se ter todo um processo, devido, legal e correto, para que o Estado possa julgar da melhor forma, preservando sempre o direito das partes e, por isso, se fala que ao direito de ação também corresponde ao direito de defesa da outra parte, na medida em que tanto o autor quanto o réu têm direito.”
A teoria da ação como um direito subjetivo público autônomo e abstrato é a que melhor atende aos anseios do processo civil contemporâneo.
Surgiu com Liebman, importante processualista italiano que em sua estadia no Brasil muito influenciou na consolidação do processo civil brasileiro, a teoria da ação eclética.
Para Liebman a ação é um direito autônomo e abstrato, mas é necessário que o autor preencha algumas condições para a existência do direito de ação. Autores brasileiros aprimoraram a visão de Liebman e sustentaram que as condições da ação são condições para o exercício irregular do direito e não para a existência do direito de ação. O ordenamento processual brasileiro adotou a teoria eclética de Liebman que pode ser verificada nos arts. 3° e 267, VI, do Código de Processo Civil.
Importante ressaltar, por fim, que o direito de ação tem fundamental constitucional, pois é consectário do art. 5°, XXXV, da CF/88, que dispõe sobre o amplo acesso à justiça.
c) Condições da ação – Condições genéricas
O Estado presta a tutela jurisdicional mediante o exercício do direito de ação. No entanto, a lei pode determinar quais são as condições em que este mesmo direito é exercido. As condições da ação para o efetivo exercício do direito de ação cuja ausência de qualquer uma delas acarreta a extinção do processo sem resolução do mérito por carência de ação.
A verificação da presença das condições da ação é verificada provisoriamente pelo juiz através dos fatos narrados pelo autor na petição inicial. Esta verificação inicial das condições da ação com base nos fatos alegados pelo autor é denominada de teoria da asserção.
As condições da ação são legitimidade, interesse processual e possibilidade jurídica do pedido. (L.I.P)
Legitimidade. Conforme dispõe o art. 6° do Código de Processo Civil de 1973 e o art. 643 da Consolidação das Leis do Trabalho, ninguém poderá pleitear em nome próprio direito alheio. Somente o titular do direito pode buscar a tutela jurisdicional. Trata-se da legitimação ordinária, onde o próprio titular do direito exercita o direito de ação.
Já legitimação extraordinária ocorre quanto quem não é titular do direito pleiteia direito alheio em nome próprio nas hipóteses autorizadas por lei. Os exemplos mais recorrentes são o da atuação dos sindicatos e em alguns casos de atuação do Ministério Público.
A legitimação extraordinária pode ser subordinada ou autônoma. Na legitimação extraordinária subordinada o legitimado ordinário deve estar junto com o legitimado extraordinário. Na legitimação extraordinária autônoma o legitimado extraordinário pode atuar sozinho, independente do legitimado ordinário.
Interesse processual. O interesse processual caracteriza-se busca de um resultado útil através da atividade jurisdicional. Assim, o interesse processual tem como base o binômio necessidade-adequação. A necessidade é a urgência de se restaurar uma situação ocasionada pela prática de um ato contrário ao direito. Por exemplo, se Mévio pediu dinheiro emprestado a Tício e não pagou na data aprazada surge a necessidade de se buscar a tutela jurisdicional.
A adequação diz respeito a relação entre o tipo de provimento jurisdicional solicitado e a situação relatada pelo autor. Se o autor pretende que o locatário que não paga aluguel seja despejado deve ingressar com uma ação de despejo e não com uma ação de usucapião. Caso, por absurdo que pareça, o autor ingressar com uma ação de usucapião para obter o despejo do locador não estará requerimento o provimento adequado e, portanto, não haverá interesse de agir.
Possibilidade jurídica do pedido. O pedido formulado pelo autor deve ser amparado pelo ordenamento jurídico brasileiro. Não há, no Brasil, por exemplo, como se exigir cobrança por jogos considerados ilegais pelo ordenamento jurídico, por lhe faltar possibilidade jurídica do pedido.
d) Condições da Ação – Específicas
As condições mencionadas acima constituem as denominadas condições genéricas da ação. É possível que o legislador atribua algumas condições específicas para o exercício do direito de ação em alguns casos. Por exemplo, no Mandado de Segurança é exigido o direito líquido e certo como condição específica. Na ação rescisória é exigido o depósito de 5% do valor da causa. Nestes casos, o exercício do direito de ação está subordinado ao preenchimento das condições genéricas e específicas da ação.
e) Elementos identificadores da demanda
Toda ação judicial, ou o seu instrumento que é a petição inicial, possui elementos identificadores que permite individualizar determinar demanda. Neste sentido, toda demanda tem elementos de identificação que podem ser definidos como partes, pedidos e causa de pedir.
A finalidade maior dos elementos identificadores da demanda é evitar que haja ações versando sobre a mesma matéria de fato e sobre as mesmas partes. Quando as demandas possuem os mesmos elementos diz-se que ocorreu o fenômeno processual da litispendência, conforme se depreende do art. 301, §3°, do Código de Processo Civil.
Partes. São as pessoas que participam do contraditório. No processo civil as partes são autor e réu. No processo penal acusador e acusado ou réu, no processo trabalhista Reclamante e Reclamado. Não se pode confundir a parte com seu representante legal. Um bebê pode ser parte num processo, mas deve ser representado por sua mãe ou por seu pai. O representante não é parte.
Pedido. O pedido é dividido em duas categorias. Pedido mediato e pedido imediato. O pedido imediato é a providência jurisdicional que se pretende com a ação. Se “A” quer que “B” seja despejado de seu imóvel deve buscar uma providência jurisdicional, uma sentença que condene “B” a sair do imóvel. Esta sentença condenatória é o pedido imediato.
O pedido mediato é o bem da vida, ou seja, o que se pede através de uma sentença judicial. No caso exemplificado acima o pedido mediato, bem da vida, é o próprio imóvel.
Causa de Pedir. A causa de pedir é o fundamento do pedido. A causa de pedir é o conjunto dos fatos narrados pelo autor onde tais fatos violaram um dever jurídico ou uma norma jurídica. Trata-se dos fundamentos de fato e de direito. Os fatos alegados pelo autor são denominados de causa de pedir remota e o fundamento jurídico é a causa de pedir próxima.
Imagine a seguinte situação:
José foi atropelado por um ônibus. Narra na sua petição inicial que no dia 21/07/09, por volta das 21h, estava atravessando a Rua Vieira Souto quando foi violentamente atropelado por um ônibus que avançara o sinal. Esta narrativa corresponde à causa de pedir remota, ou seja, os fatos que ensejou o dano.
Portanto, continua José em sua petição, esta conduta ilícita do motorista do ônibus causou danos de ordem física, moral e material e estes devem ser indenizados na forma do art. 186 do Código Civil. Este fundamento, de direito, assentado no art. 186 do CC/02, é a causa de pedir próxima.
Alguns autores denominam os fundamentos de direito de causa de pedir remota e os fundamentos de fato de causa de pedir próxima. Esta classificação é minoritária.
Teoria da substanciação. O direito processual brasileiro está assentado na teoria da substanciação da causa de pedir. A teoria da substanciação é aquela em que o Juiz tem como base, para julgar, os fatos narrados pelo autor independente do fundamento jurídico apontado pelo autor. Significa dizer que se o autor pedir uma indenização baseado No art. 186 do Código Civil o juiz pode julgar procedente o pedido, mas pelo fundamento do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor.
Em determinada audiência de instrução de julgamento realizada em sede de juizado especial cível, em que tive a oportunidade de atuar como advogado do autor, a representante legal da empresa ré requereu à juíza leiga emenda à contestação para ampliar os argumentos da defesa. Diante da manifestação inusitada, e para mim contrária ao princípio da eventualidade (art. 302 do CPC), me manifestei no sentido da impossibilidade de complementação da contestação, em audiência, em sede de juizados especiais cíveis que tenham processamento eletrônico, considerando que a defesa já foi devidamente apresentada em momento anterior à própria audiência. A insistência da advogada e o silêncio da juíza leiga me motivaram a registar aqui a minha posição sobre o tema, que ainda não teve o devido tratamento na doutrina processual civil. Penso que o processamento eletrônico, inaugurado pela Lei. 11.419/06 impôs séria reflexão sobre institutos processuais consolidados a partir da experiência cotidiana do proce...
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