A competência no processo civil é definida através de critérios objetivos a partir dos quais se é possível definir qual o foro e juízo competente para apreciação de determinada causa. Nas Comarcas ou Seções Judiciárias onde há mais de um órgão competente para julgamento de determinada causa haverá o sorteio através da distribuição, nos termos do art. 251 do CPC/73, se definir o respectivo juízo competente.
Distribuída a demanda e definido o juízo competente não mais poderá ocorrer modificações por força do princípio da perpetuação da jurisdição disposto no art. 87 do Código de Processo Civil. Importante observar que as modificações de fato ou de direito são irrelevantes no que diz respeito à fixação de competência. Exemplifico: imagine que A residente e domiciliado em São Paulo ajuizou ação de cobrança em face de B, residente em Manaus. Considerando que se trata de direito obrigacional (cobrança), o critério para fixação da competência de foro seguirá a regra geral do art. 94 do CPC, ou seja, o domicílio do réu, nesse caso Manaus. Distribuída a demanda em Manaus, mesmo que o réu se mude para a cidade do Rio de Janeiro não haverá modificação de competência em razão dessa mudança de fato, prevalecendo o princípio da perpetuação da competência (art. 87 do CPC/73).
É evidente que a regra da perpetuação da jurisdição admite exceções, conforme as hipóteses elencadas no art. 87 do CPC, nos casos de extinção do órgão julgador ou nos casos de alteração da competência em razão da matéria. Na primeira hipótese a modificação da competência ocorrerá quando o órgão for extinto. Pense-se na hipótese de uma determinada ação reivindicatória foi distribuída para a 3º Vara Cível da Comarca de Niterói/RJ. Se por algum motivo o órgão foi extinto, as ações que tramitam por lá serão redistribuídos para outros órgãos. Na segunda hipótese ocorrerá a modificação de competência nos casos de alteração da competência em razão da matéria. Imagine o caso em que em determinado Estado o juízo competente para processar e julgar inventário é o cível. Posterior modificação no Código de Organização Judiciária alterou a competência para julgamento dos inventários determinando que a competência passará a ser das Varas de Família. Nesses casos, tanto no primeiro como no segundo caso, representam modificações de competência que decorrem da exceção ao princípio da perpetuação da competência disposto no art. 87 do CPC.
O Código de Processo Civil de 1973 e também o NCPC tratam de outras hipóteses de modificação de competência. Considera-se modificação de competência, nesse caso, a distribuição da demanda para órgão judicial diverso daquele definido pela Lei, conforme assinala Luiz Fux (Teoria Geral do Processo Civil). Importante ressaltar que somente a competência relativa, que tem o interesse das partes como base, admite a modificação de competência. A competência absoluta, por tratar de interesse público, não admite modificação de competência para órgãos diversos dos definidos em Lei.
A modificação de competência, do ponto de vista didático, pode ser dividida em voluntárias e legais. A cláusula de foro de eleição (art. 111 do CPC) e a prorrogação (art. 114 do CPC) são causas voluntárias de modificação de competência. A conexão (art.103) e a continência (art. 104) são causas legais de modificação de competência.
A cláusula de foro de eleição é a possibilidade de modificação de competência onde as partes, através de contrato estabelecer qual o foro em que eventual demanda decorrente do negócio jurídico será processada e julgada. Importante destacar que a cláusula de foro de eleição somente poderá versar sobre o local onde a ação será distribuída (foro) e jamais poderá definir a competência de juízo (em razão da matéria). Se a cláusula de foro de eleição for desrespeitada a parte ré poderá apresentar exceção de incompetência para arguir o respectivo vício. Nesse caso, a modificação voluntária prevalece sobre o critério legal.
A segunda hipótese de modificação voluntária da competência é o fenômeno da prorrogação. Haverá prorrogação da competência sempre que a ação for distribuída para um órgão incompetente (incompetência territorial) e diante da inércia do réu o vício é convalidado tornando um juízo que era inicialmente incompetente em competente. Trata-se de causa voluntária de modificação de competência, pois o legislador fixou como regra o domicilio do réu, considerando sua posição de desvantagem processual. Quando o autor propõe a demanda perante um órgão incompetente a lei autoriza ao réu optar por ser processado em local diverso do definido em lei através do fenômeno processual da prorrogação.
As hipóteses legais ou obrigatórias de modificação de competência são a conexão e a continência. Nesses casos a lei determina que as ações que possuam identificação, mas que tramitam em órgãos diversos sejam reunidas em um só órgão para possibilitar o julgamento conjunto das demandas evitando, dessa forma, julgamento conflitante ou contraditório. São consideradas conexas as ações que tenham objeto (pedido) ou causa de pedir, conforme conceitua o art. 103 do CPC. Podemos citar como exemplos de ações conexas a ação de despejo movida por A em face de B na Comarca da Capital e a ação de consignação em pagamento de B em face de A em outra Comarca. Nesse caso as ações têm em comum a mesma causa de pedir, ou seja, o inadimplemento e, portanto, devem ser reunidas para possibilitar o julgamento em conjunto.
A continência ocorrerá sempre que duas ações tiverem em comum as mesmas partes, a mesma causa de pedir, mas o pedido de uma é mais abrangente, e contém em seu bojo, o outro. Exemplifico: Imagine que A ingressa com uma ação em face de B pretendendo obter a declaração de nulidade de uma cláusula do contrato. Em outra ação, em outro foro, B ingressa com ação em face de A objetivando a nulidade de todo o contrato. Nessa hipótese ocorrerá continência, pois o pedido da segunda ação é mais abrangente do que o da primeira ação.
Em ambos os casos (conexão ou continência) o CPC estabelece critérios para se definir qual será o juiz competente para julgar ambas as causas (prevenção). Se as ações conexas ou continentes tramitarem dentro da mesma competência territorial (mesma Comarca ou Seção Judiciária) o juízo prevento será o que despachou a inicial em primeiro lugar (“cite-se”), conforme art. 106 do CPC. Quando as ações tramitarem em órgãos pertencentes à Comarcas ou Seções Judiciárias distintas a prevenção se dará pela citação válida ou seja quando o réu foi devidamente cientificada da ação distribuída contra si, conforme art. 219 do CPC.
Por fim, nas hipóteses de modificação de competência se faz importante identificar quais as causas de modificação, se voluntárias ou obrigatórias, para melhor compreensão do caso estudado.
Em determinada audiência de instrução de julgamento realizada em sede de juizado especial cível, em que tive a oportunidade de atuar como advogado do autor, a representante legal da empresa ré requereu à juíza leiga emenda à contestação para ampliar os argumentos da defesa. Diante da manifestação inusitada, e para mim contrária ao princípio da eventualidade (art. 302 do CPC), me manifestei no sentido da impossibilidade de complementação da contestação, em audiência, em sede de juizados especiais cíveis que tenham processamento eletrônico, considerando que a defesa já foi devidamente apresentada em momento anterior à própria audiência. A insistência da advogada e o silêncio da juíza leiga me motivaram a registar aqui a minha posição sobre o tema, que ainda não teve o devido tratamento na doutrina processual civil. Penso que o processamento eletrônico, inaugurado pela Lei. 11.419/06 impôs séria reflexão sobre institutos processuais consolidados a partir da experiência cotidiana do proce...
Comentários
Postar um comentário